segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

ACÇÃO


      A análise de Memorial do Convento permite constatar a existência de duas narrativas simultâneas: uma de carácter histórico e outra ficcionada.
          A acção principal é a edificação do convento de Mafra – desejo e promessa de D. João V e a acção secundária é a história de amor entre Blimunda Sete-Luas e Baltasar Sete-Sóis; a construção da passarola (sonho de Bartolomeu de Gusmão).
          Na acção principal encaixam-se outras acções, constituindo diferentes linhas de acção que se articulam com a primeira.

1º linha de acção
A do rei – D. João V
Abrange todas as personagens da família real e relaciona-se com a segunda linha de acção, uma vez que a promessa do rei é que vai possibilitar a construção do convento. Esta linha tem como espaço principal a corte e, depois, o convento, na altura da sua inauguração, no dia do aniversário do rei.
2º linha de acção
A dos construtores do convento
Esta é a linha da acção principal da história, a par da quarta – a que respeita à construção da passarola. Esta segunda linha de acção vai ganhando relevo e une a primeira à terceira: se o convento é obra e promessa do rei, é ao sacrifício dos homens, aqui representados por Baltasar e Blimunda, que ela se deve. Glorificam-se aqui os homens que se sacrificam, passam por dificuldades, mas que também as vencem.
3º linha de acção
A de Baltasar e Blimunda
Nesta linha relata-se uma história de amor e o modo de vida dos portugueses. Baltasar e Blimunda são os construtores da passarola; Baltasar é também, depois, construtor do convento, constituindo-se como paradigma da força que faz mover Portugal – a do povo.
4º linha de acção
A de Bartolomeu Lourenço
Relaciona-se com o sonho e o desejo de construir uma máquina voadora. Articula-se com a primeira e segunda linhas de acção, porque o padre é mediador entre a corte e o povo. Também se enquadra na terceira linha, dado que a construção da passarola resulta da força das vontades que Blimunda tem de recolher para que a passarola voe.

          Verifica-se a existência de um plano ficcional que se cruza com a História, uma vez que a construção da passarola, evento a que a História se refere, acaba por ser ficcionada quando se afirma que se moverá pela força das “vontades” que Blimunda recolhe.
          A construção da passarola é o fio condutor de toda a narrativa pois consegue-se observar quase todos os passos, e até partilhar do entusiasmo das personagens, enquanto que da construção do convento só se sabe as fases da construção. Parece, até, que só a partir do décimo sétimo capítulo é que a passarola cede lugar ao convento. Na realidade, é a construção da máquina que conduz a narrativa e é ela que materializa o sonho dos seus construtores e lhes vai permitir a fuga de um mundo dominado pela injustiça e pela prepotência que caracteriza a política vigente.

          As sequências narrativas, que fazem parte da acção, podem surgir articuladas de três maneiras diferentes:
 à Encadeamento: por exemplo, o desenrolar da relação amorosa entre Blimunda e Baltasar, a partir do momento em que se conhecem no auto-de-fé, onde a mãe de Blimunda é condenada, até ao reencontro do casal no final da acção, na altura em que Baltasar está a ser queimado na fogueira da Inquisição.
à Encaixe: por exemplo, as histórias de vida que Francisco Marques, José Pequeno, Joaquim da Rocha, Manuel Milho, João Anes, Julião Mau-tempo e Baltasar Mateus contam uns aos outros (Cap. XVIII), quando estes se encontram longe dos seus lares a trabalhar na construção do convento.
à Alternância: por exemplo, a história de Manuel Milho sobre uma rainha e um ermitão (Cap. XIX) é contada por partes, à noite, dando lugar à narração de outros eventos.

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